07
Mai14
Um país em fuga
Pedro Figueiredo
Sempre coube ao Governo, seja de esquerda ou de direita, criar as condições essenciais para uma vida em sociedade capaz de gerar bem estar aos seus cidadãos. Poderá divergir-se na questão do Estado ter um papel maior ou menor na dinâmica da economia, mas a forma como é articulada a administração pública deveria ser (bem) mais expedita, para que não se criem bloqueios ao progresso. Portugal terá, porventura, neste caso particular, o maior calcanhar de Aquiles. As diferentes concepções de Estado que os dois maiores partidos têm tido ao longo destes anos - a anularem-se mutuamente na rotatividade legislativa - fazem, muitas vezes, voltar-se à estaca zero ou a registar retrocessos consideráveis. Basta recordar o que aconteceu com o Simplex.
No actual contexto tecnológico, de conhecimento abrangente em relação às diferentes realidades sociais, culturais e, acima de tudo, profissionais, as pessoas estão muito mais informadas das possibilidades que se lhes apresentam. A mais bem preparada geração de sempre - no que às habilitações académicas diz respeito -, está comprovada. Há, hoje, indubitavelmente, muito mais licenciados. Do census de 2001 para o de 2011, o número quase duplicou. Geração que está a sofrer na pele a cada vez mais complicada entrada no mercado de trabalho, com os que conseguem a ser remunerados a valores que deviam fazer corar de vergonha governo e entidades patronais.
A tudo isto, acrescente-se o completo desnorte do actual executivo em quase todas as áreas, algumas delas onde nem sequer cola o argumento do "não há dinheiro". Até porque, pelos vistos, há almofadas
Começa cada vez mais a generalizar-se a ideia de que os impostos colectados - cada vez maior a carga, apesar das constantes promessas que não haverá mais aumentos dos mesmos - são mal utilizados, criando a sensação que o bolso do contribuinte não tem fundo.
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Começa cada vez mais a generalizar-se a ideia de que os impostos colectados - cada vez maior a carga, apesar das constantes promessas que não haverá mais aumentos dos mesmos - são mal utilizados, criando a sensação que o bolso do contribuinte não tem fundo.
E que tal está lá fora?
O ministério das Finanças poderia, anualmente, avançar o número de pessoas que, de um ano para outro, passam de uma situação de contribuinte activo para passivo, usando uma terminologia que parece estar em voga. Isto porque o registo consular é voluntário. Ninguém é obrigado a avisar o Estado português que, a partir de uma determinada data, passou a ser residente (trabalhador ou não) numa determinada cidade de um qualquer outro país. Sem prejuízo, obviamente, para uma possível ajuda em caso de necessidade.
Um dos indicadores interessantes de análise, são as remessas de emigrantes. De acordo com a Pordata, recorrendo a dados do Banco de Portugal, 2012 registou um aumento de 13,1% em relação a 2011 e 2013 de 9,7% em relação a 2012. A ordem de grandeza ronda os 3 mil milhões de euros, mas não deixa de ser interessante perceber o aumento verificado nos anos de governo de coligação em comparação com os anteriores e não tem, seguramente, a ver com o facto dos emigrantes portugueses terem, de repente e em contra-ciclo, ficado mais abonados e, por isso, com maior capacidade financeira para o envio de dinheiro.
Portugal pode não ter a capacidade, directa, de perceber quantos dos seus cidadãos opta por procurar oportunidades fora do país, mas na grande maioria dos destino, os números não mentem. Quem sai procura, naturalmente, países com uma situação económica e financeira mais estável. Espanha, por exemplo, tem registado uma quebra no fluxo de emigração portuguesa. Basta seguir as notícias do país vizinho para se perceber porquê. Estão, igualmente, a andar para trás no tempo. Foco principal, então, para as economias mais seguras da Europa. De acordo com o Observatório da Emigração, da Secretaria de Estado das Comunidades, segundo os números enviados, a Alemanha passou de 5.752 registos de entrada em 2011 para 11.401 em 2013 (9.054 em 2012). Quase duplicou em dois anos, apenas.
Portugal pode não conseguir contabilizar (quanto mais saber o destino dos que saem), mas na Alemanha é fácil. Cada novo morador de uma cidade está obrigado a fazer um registo na câmara municipal local denominado Meldebestatigung. Sem esse registo (que gera um documento com o mesmo nome), nada se faz no país. Nem mesmo abrir uma conta bancária, quanto mais arranjar trabalho. Esse documento é a prova que a pessoa vive naquela morada, que automaticamente entra nos registos centrais do Estado, desde a polícia às finanças. Este registo é obrigatório não só para estrangeiros como para cidadãos alemães. Se um morador de Munique for trabalhar e viver para Berlim, terá de ter o mesmo procedimento. Na Alemanha parece não haver o conceito de "morada desconhecida".
Estes são apenas números conhecidos não estando contabilizados quem foge às estatísticas. Como no caso dos números do desemprego, de todos aqueles que, simplesmente, desaparecem do sistema quando atingem o limite do direito ao subsídio.
Quantos portugueses, de facto, saíram do país nos últimos três anos? Está, ou não, Portugal a perder a sua mais bem preparada geração por culpa da situação cada vez mais insustentável que se vive no país? A quantos já não tocou a solução, muitas vezes sem recurso ao planeamento necessário a que as circunstâncias exigem? Pode ser que assim se perceba que o primeiro-ministro envergonhou o país ao ter dado o estrangeiro como solução para arranjar emprego.