Síndrome de Estocolmo colectivo
Não foi há muito tempo que as Nações Unidas aconselhou os países a não chegarem a qualquer tipo de acordo com terroristas. O tópico serve de introdução ao que o Governo está agora a tentar implementar como critério para o despedimento nos casos da extinção de postos de trabalho. E o terrorismo não é dos sindicatos.
Em Janeiro de 2012 foi assinado um acordo entre Governo e parceiros sociais (UGT e entidades patronais, a CGTP ficou de fora) para o novo regulamento laboral, sob o signo do «Compromisso para o crescimento, competitividade e emprego». São 52 páginas que terminam com a seguinte frase: «O Governo compromete-se, no âmbito das matérias laborais previstas no presente Acordo, a não introduzir qualquer aditamento ou matérias diferentes, salvo se previamente acordadas com as Partes Subscritoras.»
Acontece que seis meses depois, João Proença, então ainda líder da UGT, veio afirmar que o acordo que havia assinado era mau – admitindo implicitamente que optou pelo mal menor –, mas o processo havia ficado encerrado e que nem o Governo e muito menos a Troika poderiam alterar o que quer que fosse. Em Outubro, o discurso de Proença já era outro, sentindo necessidade de se explicar em público, afirmando que o que o Governo estava a colocar em prática não tinha nada a ver com o acordo assinado em Janeiro e sim com o que a Troika exigia em termos de flexibilização, ou liberalização dos despedimentos, no mercado de trabalho, conforme a terminologia de quem o defendesse.
A UGT não foi com certeza a única a queixar-se de ter sido enganada. O próprio ministro da economia da altura, Álvaro Santos Pereira, também se deve ter sentido traído depois da enorme satisfação por um acordo que é sempre difícil de conseguir.
A má fé do Governo (e não se pode tratar de outra coisa já que não cumpriu com o que ficou acordado em sede de concertação social) deveria ter servido de alerta para esta nova ronda negocial com os mesmos parceiros, embora com novas lideranças. Até o ministro da economia é outro, mas há protagonistas que se mantêm em funções. Os mesmos que foram responsáveis pelo desrespeito de que foram acusados ao não cumprirem o acordo estabelecido em 2012.
Não vale a pena entrar em detalhes sobre as prioridades dos critérios para o despedimento que o Governo ainda discute em Conselho de Ministros. As avaliações de desempenho (pelos vistos, o principal critério), tendo em conta a realidade das mesmas quer no sector público quer em algum do privado, só podem ser do mesmo domínio que as intervenções de Hugo Soares. Anedótico.
Espantoso é ver como ainda se dá margem de manobra a um Governo que já perdeu qualquer credibilidade de negociar com (e, acima de tudo, em nome d’) os portugueses. Só pode ser Síndrome de Estocolmo coletivo.