Cá vou eu defender o Nuno Melo
Um dia havia de ser, um dia havia de estar em frontal desacordo com o Miguel Abrantes. Que fosse num tópico que me obrigasse a defender o Nuno Melo, só pode ser fruto do mau olhado, pois claro. Pois bem, escreve o Miguel ali ao lado:
"Perante este aterrador quadro, esperar-se-ia alguma contenção verbal por parte do CDS-PP. Mesmo assim, Paulo Portas resolveu soltar Nuno Melo. E, como acontece em regra, o cão de fila está a fazer uma figura triste por várias razões.
Em primeiro lugar, o empertigado Nuno Melo decidiu colocar algumas questões à Comissão Europeia sobre a legalidade da taxa turística. Ignora ele — que há largos anos é deputado europeu — que os tratados europeus impedem a adopção de normas que tenham como efeito a discriminação de cidadãos na União Europeia, salvo no âmbito da fiscalidade.
Em segundo lugar, são inúmeras as taxas e taxinhas a que estão sujeitos os utilizadores dos aeroportos portugueses. É espantoso que este eurovideirinho se mostre indignado apenas com a taxa turística, a qual incide só sobre os estrangeiros".
Ora bem, por partes:
- Não acho que o Nuno Melo esteja a fazer uma figura triste quando questiona a Comissão sobre que sanções poderia um estado-membro ser alvo se violasse a proibição explicita nos tratados da discriminação em função da nacionalidade. Deus sabe que o Nuno Melo é pródigo em fazer figuras tristes, ainda para mais no que a perguntas à Comissão Europeia diz respeito (como vão as relações da União com o Quiribati?), mas esta parece-me razoável, ainda por cima face à resposta dada pela comissária Vera Jourová à sua colega de bancada, a eurodeputada Claúdia Monteiro de Aguiar
- Não sei onde é que o Miguel foi buscar que os "tratados europeus impedem a adopção de normas que tenham como efeito a discriminação de cidadãos na União Europeia, salvo no âmbito da fiscalidade". Há provisões legais especificas, mais fruto de acórdãos do Tribunal de Justiça da União Europeia do que de outra coisa, relativamente ao tratamento diferenciado dos cidadãos europeus nas diferentes fiscalidades nacionais, muito usais quando falamos da discriminação em função da residência, mas não me recordo de nenhum que permita claramente a discriminação fiscal pela nacionalidade, ainda para mais numa "taxa de entrada" numa capital europeia, numa contradição com principio da livre circulação de cidadãos
- Francamente, não percebo o ponto do Miguel no terceiro parágrafo, ainda para mais com o destaque que dá a bold ao "a qual incide só sobre os estrangeiros". Qual é a lógica? Sim, há já um certo de número de taxas aos utilizadores dos aeroportos nacionais (que, tendo sido muito aumentadas desde a privatização do monopólio estatal que era a ANA, não foram inventadas no último par de anos) e agora o município de Lisboa negociou a aplicação de mais uma outra, com a brutal agravante de se propor a taxar exclusivamente os cidadãos que não sejam detentores da nacionalidade portuguesa - um tipo de discriminação fiscal que me decepciona vinda dum executivo camarário do Partido Socialista. O Nuno Melo, relembremos, é [para mal dos nossos pecados] um deputado no Parlamento Europeu e nessa qualidade representa todos os cidadãos da União e não exclusivamente os cidadãos do círculo que o elege. É naturalíssimo que questione a possível violação do direito comunitário e as suas implicações, é naturalíssimo que se oponha a que os cidadãos dos outros 27 estados-membros da União Europeia sejam especialmente taxados no aeroporto de Lisboa face a um cidadão que por ser nacional dum outro estado-membro estará isento. E, para mais, não percebo o tom implícito do Miguel - como é para estrangeiros, não importa? Se fosse a discriminação em função do género ou da religião era gravíssimo, mas como é em função da nacionalidade é na boa? É que nem sequer falamos dum tratamento diferenciado em função da localidade de residência do passageiro, falamos da discriminação pura e simples, com implicações fiscais, em função da nacionalidade do cidadão que chega a Lisboa por via aérea ou marítima, não parecendo a Câmara sequer interessada em saber se este cidadão é ou não um habitante da cidade. A questão do "só para estrangeiros" parece-me muitíssimo pertinente, se não do ponto vista legal, pelo menos do ponto de vista politico e do precedente que se abre (porque não cobrar portagens especiais para cidadãos não-nacionais? ou propinas de valor diferenciado? taxas moderadoras mais altas a estrangeiros? ...)
Com o resto do post não podia estar mais de acordo. O descaramento do CDS, na forma como finge não ter sido o patrocinador oficial do maior aumento de impostos de que há memória, de ter estado no executivo municipal que introduziu a primeira taxa turística em Portugal, a autarquia de Aveiro, e de ter sido o fervoroso apoiante do actual presidente da câmara municipal do Porto, que se mostrou favorável a este tipo de taxação. Mas que a lata do irrevogável partido contribuinte não parece ter limites é já matéria sabida e estudada.