António José Seguro, na entrevista que deu à Judite ali na TVI, revelou-se manifestamente incomodado por as perguntas da jornalista serem sobre o Partido Socialista e não, entre outros tópicos, sobre "a defesa que o Partido Socialista fez junto do Tribunal Constitucional dos funcionários públicos e dos pensionistas".
Ora bem, como nem todos somos o Álvaro Beleza e temos uma cena chamada memória, recordo que dos 12 acórdãos com declarações de inconstitucionalidade emitidos pelo Tribunal Constitucional para diplomas aprovados pela maioria parlamentar PSD/CDS-PP, houve 3 em que a maioria da bancada parlamentar do PS, devido à imposição da disciplina de voto, nada fez para travar a sua aprovação no plenário da Assembleia da República: o primeiro diploma que criava o Tribunal Arbitral do Desporto, as alterações ao Código do Trabalho e o Orçamento de Estado para 2012. Recordemos mais pormenorizadamente como reagiu a direcção à possibilidade de deputados do PS virem a requerer a fiscalização sucessiva da constitucionalidade do Orçamento de Estado para 2012:
"Confrontado com a posição deste grupo de deputados socialistas, José Junqueiro, vice-presidente da bancada do PS, afirmou que "discorda" dessa iniciativa.
"Temos a dizer uma coisa clara [a esses deputados]: A nossa prioridade é a fiscalização política permanente deste Orçamento do Estado. Este Orçamento do Estado é do PSD e do CDS, da maioria de direita", começou por referir o dirigente da bancada socialista.
Segundo José Junqueiro, o "serviço do PS ao país é a fiscalização política permanente, porque essa é a chave da questão, a questão que é útil a todos os portugueses".
"Essa intenção [de recorrer à fiscalização da constitucionalidade do Orçamento] é uma intenção de que discordamos de forma muito clara, porque a prioridade do PS e da bancada do PS será a fiscalização política permanente deste Orçamento", reiterou o vice-presidente do Grupo Parlamentar socialista."
E para que não restem dúvidas:
"Carlos Zorrinho foi claro: “O PS demarca-se totalmente desta iniciativa”."
Já em 2012, a direcção da bancada parlamentar chegou mesmo a ameaçar com sanções Isabel Moreira, a deputada independente eleita pelo PS, pelos seus votos contra a proposta de Orçamento de Estado de 2012 e contra as propostas de alteração ao Código do Trabalho.
António José Seguro reagiu à última decisão dos juízes do Tribunal Constitucional afirmando que a mesma era "uma boa noticia para todos os democratas que respeitam uma Constituição da República Portuguesa e um Estado de Direito", que é “indesculpável que o país tenha um Governo que viola a lei fundamental do país" e que "o PS cumpriu o seu dever na defesa dos portugueses". Com certeza, concordo, muito bem. O que não invalida o seguinte: no final de 2011 e em princípios de 2012, a direcção do Partido Socialista estava aparentemente pronta a marimbar-se na defesa da Constituição da República Portuguesa. Felizmente, mudou radicalmente de atitude. Mas nunca explicou o discurso que teve outrora nem a razão da sua alteração, o que nos leva a concluir que caso não tivessem existido pressões por parte de deputados na Assembleia da República, o PS poderia hoje continuar indiferente às sucessivas ilegalidades aprovadas pela actual maioria parlamentar.
Prefiro pensar que não seria assim, que o que se passou nos primeiros meses do mandato do atual Secretário-Geral do PS foi uma falha ocasional e que os dirigentes teriam eventualmente chegado sozinhos à conclusão de que cabe, coube e sempre caberá ao Partido Socialista a defesa do nosso Estado Social e de Direito Democrático.
Todavia, e ainda no campo da memória, é de relembrar que houve quem fosse sempre coerente nesta defesa.