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"Não será necessário em Portugal cortar mais salários nem despedir gente para poder cumprir um programa de saneamento financeiro, mas temos de ser efectivos a cortar nas gorduras" - Pedro Passos Coelho, 30 de Abril de 2011.
Lembram-se desta conversa? As "gorduras do Estado" percorreram um longo caminho. De tempos a tempos, deputados do PSD em debates televisivos ou comentadores "independentes" ainda vinham falar dos tais depósitos de adiposidade estatal que teriam de ser removidos, uma remoção que seria suficiente para "sanear" o Estado, mas toda a gente entretanto parece ter-se esquecido desta espécie de Fairy coelhista.
O que é certo é que, mais de quatro anos depois, a despesa primária do Estado continua por controlar. As fundações inúteis permanecem, as PPP's nunca nos custaram tanto dinheiro, e os consumos intermédios não foram reduzidos, antes ampliados: os pareceres pedidos a consultoras e a escritórios de advogados atingiram números nunca vistos, os ajustes directos são pornograficamente multiplicados (muitos por falta de recursos na administração central, que dispensou funcionários com décadas de experiência) e a despesa com gabinetes atinge, no orçamento para 2015, um valor recorde.
Enquanto se corta nas prestações sociais, se mantêm cortes nos salários da administração pública e se aumenta a carga fiscal com taxas e impostos absurdos, sobe a despesa com os gabinetes em mais de 800 000 euros. Comparativamente a 2012, a subida já é de 4,3 milhões. Enquanto se retira 700 milhões (só em 2015) à Educação, o dinheiro para assessores, adjuntos e afins jorra de forma abundante. A máquina de propaganda precisa de ser alimentada, já sabemos, sobretudo em ano de eleições. Que Passos Coelho tenha criticado, quando era candidato a primeiro-ministro, os gastos com assessores e o tamanho dos Governos de Sócrates, é um pormenor da História. Passos navega há muito em mar alto, impulsionado por uma sensação de impunidade absoluta e por uma confiança cega na inutilidade criminosa de Cavaco Silva. Pode fazer tudo, porque sabe que está a prazo. É um inimputável.
Tresanda a mofo e a poeira. Uma coisa arcaica e a preto&branco, um ser saído do Viagens na Minha Terra, uma aparente personagem clerical, amarga e bronca. Um fidalguete com cartão de cliente da Quebramar. Um Duarte Marques de nariz espevitado, um inspector Javert mais bochechudo, um César das Neves jovial. Senhores e Senhoras, é isto o futuro do mui nobre Centro Democrático Social - Partido Popularucho: Miguel Pires da Silva, presidente da Juventude lá do ducado, a associação nacional dos putos com pedigree. E a criatura dá entrevistas. Ora vejam esta, onde o benjamim apresenta os seus grandes planos para a nação. Tão extenso, complexo e munífico é o seu elaborado pensamento que eu, simples membro da ralé, sou obrigado a condensá-lo em 2 personificáveis momentos essenciais:
1) Momento Marinho Pinto - Pires da Silva clama, com o seus puros e naturais pulmões, que a paneleirada nos quer dominar. E que os homos são uns cobardolas por não admitirem o seu objectivo essencial, uns medricas, uns medrosos - uns maricas, basicamente. "O projecto tem alguma cobardia e não vai ao encontro daquilo que eles (os homossexuais) querem. Os gays e as lésbicas em Portugal fazem um debate muito histérico em torno disto tudo. E não têm coragem de admitir o que realmente querem" denuncia o nosso D. Miguel. 'Eles', aqueles tipos, aquela raça, aquela coligação de fufas e boiolas "gostavam era que Portugal se transformasse num imenso arco-íris de uma ponta à outra, em que tudo fosse possível". Se ao menos ainda tivéssemos um Santo Oficio à maneira, uma Inquisição que expurgasse esta gentalha que 'vai contra tudo o que é natural'. Era queimá-los, era vê-los arder nas praças e largos das vilas e cidades do reino e colónias. E não é que andam por ai uns doidos que querem que a lei contemple a possibilidade de eles poderem educar uma criança com o vínculo da paternidade?! Cristo. Afinal, toda a gente sabe que 'ter dois pais ou duas mães é contranatura. A criança não pode crescer num ambiente saudável.' Os rebentos saem adoentados. Deficientes. Os manicómios estão cheios de cidadãos criados por pares de bichonas ou de sapatonas. Nossa Senhora. E os deputados da nação permitem esta monstruosidade? Miguel, o Natural, faz o seu julgamento: "Espero que as pessoas se assumam de uma vez por todas e não façam lóbis quase rodeados de secretismo. Que se assumam. As pessoas devem assumir-se e não viver em torno de lóbis encapotados." Assumam-se seus xibungos! Assumam-se suas sapas! Parem de viver à custa do todo-poderoso lobby das bichas, que a todos suborna e todos domina. Já o papa Francisco alertava para os seus tentáculos de lantejoulas. Ainda bem que temos Miguel Pires da Silva para nos alertar para estes horrores sociais. A seguir vai ser o quê? Casamentos inter-raciais?! Famílias monoparentais?! Divórcio?! Só Deus sabe. E haja quem lhe responda.
2) Momento Eduardo Catroga - E você, também estava a queimar o miolo com isto da crise? No sweat, Miguel Pires da Silva tem a solução: "É preciso que haja coragem do parlamento para iniciarmos uma reforma do Estado a sério, que inclua a redução do número de deputados, que reduza o número de câmaras, que reduza a máquina do Estado. Isto, hoje em dia, pesa a Portugal e pesa-nos a todos nós, que o sustentamos. A máquina do Estado, neste momento, é insustentável, o número de funcionários públicos é insustentável." Neste cúmulo do deja vu, Pires da Silva saca do Ás d'Ouros do populismo: cortem-se nos deputados. Temos muitos, diz o líder da JP. A mais. Apesar de termos a menos. Mas enfim, também temos muitos funcionários públicos. Imensos. A mais do que devíamos. Excepto que são a menos. Ora bolas, oh Miguel, restam-te os concelhos, não é? Queres extinguir uns quantos? Boa sorte com isso. Vai ser muito popular junto do pessoal da lavoura. E vai ser uma poupança de biliões, ó se. Mas serão isto todas as gorduras que todos sustentamos descaradamente? O Miguel responde: "São também essas, mas não só. Depois há outras que estão blindadas pela Constituição, (...)". E esta hein? Gorduras blindadas pela Constituição. Mas que slogan fresquinho. Bom, toda a gente sabe que lei fundamental é um emaranhado de massa gorda, a começar pela parte dos direitos fundamentais. Estado de Direito? Cambada de obesos. É óbvio que a cheiinha da CRP tem andado a lixar a vida ao nosso almo governo. Lembram-se daquela maldade feita pelo TC? "Quando vimos estas medidas serem chumbadas pelo Tribunal Constitucional, medidas extraordinárias para tempos extraordinários e extraordinariamente difíceis, e sendo elas um entrave àquilo que era a solução para Portugal e que o governo encontrou para que os esforços e sacrifícios fossem mais divididos por toda a população, para que não se tivesse de ir aos pensionistas como se quis ir, não se tivesse de ir a outros sítios - quando vemos que isso é chumbado pelo Tribunal Constitucional, a Constituição é um entrave para Portugal num momento difícil que estamos a viver." Bem, primeiro: as medidas 'eram um entrave àquilo que era a solução para Portugal'? É isso? Oh camarada Pires da Silva, dê cá um abraço, você está afinal do lado povo. Ou isso ou andou a ter explicações de sintaxe com a Maria Teixeira Alves. Sendo assim, ao menos é valente, a chamar as coisas pelos nomes: CRP = entrave para a nova restauração. E o seu patrono, o malvado tribunal da Rua do Século, está a tentar travar tais ventos reformadores. Sacana. E devido à inconstitucionalidade por este decretada das medidas (aquelas que dividiam os sacrifícios pela população - daí o ter-se metido o principio da igualdade ao barulho, não foi?), o governo teve que ir aos pensionistas. Porque o governo nem queria, não, adora os pensionistas, ama-os, vive para os satisfazer, o corte dos subsídios não abarcava os pensionistas nem nada. A culpa é da Constituição, a mazona, a que entrava o desenvolvimento. Queimei-la também, a CRP e os gays.
É assustador que esta seja, supostamente, a facção 'jovem' dum partido com assento parlamentar, membro de um governo em democracia. É assustador pensar que o futuro político do país poderá ser bem pior que o presente. É assustador que um presidente duma juventude partidária diga coisas como estas com orgulho. E que faça declarações deste género sem pensar, sem reflectir. Ou após muita reflexão...
A frase que dá o título a este texto é da autoria de Pedro Passos Coelho e foi proferida no longínquo dia 25 de março de 2011, numa altura em que o PSD repetia até à exaustão que o FMI era um grande amigo nosso e que o deveríamos receber de braços abertos. Isto, é claro, dois meses depois de ter dito ao país que a entrada do FMI em Portugal deveria levar à queda do Governo de então. Meros detalhes.
Chegados a maio de 2013, cerca de dois anos volvidos sobre a entrada em Portugal do FMI e a ascensão ao pote de Pedro "ir-além-da-Troika" Passos Coelho, começa a ser claro o rotundo embuste em que alguns cidadãos alinharam em 2011.
E a Renascença aproveitou para fazer umas contas, focando-se nos três principais alvos do XIX Governo Constitucional, nas três grandes "gorduras do Estado" que era necessário mitigar: a Saúde, a Educação e a Segurança Social. O resultado não podia ser mais esclarecedor:
Se dúvidas ainda houvesse, estes números dissipam-nas: a sanha deste Governo contra os mais desprotegidos, o ímpeto para destruir o nosso Estado Social, não surgiram agora com nenhum "relatório da Troika", nem vão principiar com o trágico corte de 4 mil milhões de euros ali defendido (cujo valor exato, ao que parece, já nem é esse). Fazem, isso sim, parte de uma agenda ideológica, mal escondida desde os tempos de campanha eleitoral, que começou a ser introduzida na nossa sociedade no momento em que alguém começou a falar na necessidade de se ir para além da Troika e que encontrou no resultado eleitoral de junho de 2011 a sua luz verde para avançar, mesmo que ninguém tenha sufragado esta transfiguração do Estado.
E termino recorrendo à citação de Passos Coelho: não, de facto não vale a pena estarmos a diabolizar o FMI. Não é o FMI que tem que ser diabolizado quando todo um Governo optou por ir além das medidas inicialmente definidas no memorando. Não é culpa do FMI, nem da Troika, que um Governo tenha achado que o frontloading de medidas de austeridade era solução para alguma coisa. O FMI não tem culpa que o Governo português não queira agora negociar as condições do seu memorando ou que, quando o fez, tenha sido para as tornar mais "ambiciosas", mais baseadas numa austeridade destrutiva de um Estado Social que é de e para todos nós.
A atribuição de novos cheques-dentista a crianças e jovens foi suspensa, sem que os motivos para tal decisão tenham sido devidamente comunicados. Segundo foi entretanto noticiado, no início de 2013 retomar-se-á a atribuição destes cheques, mas – depois de tantos avanços e recuos – eu prefiro ver para crer.
O cheque-dentista foi introduzido pelo XVII Governo, no âmbito do Programa Nacional de Promoção de Saúde Oral, e assumiu-se como um dos mais importantes passos para a resolução de um problema de décadas em Portugal: o acesso da população portuguesa a cuidados de saúde oral. O balanço realizado em dezembro de 2010, junto, precisamente, daqueles que agora viram suspenso o acesso a estes apoios, permitiu confirmar a importância e os benefícios do cheque-dentista.
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