Sistema Speenhamland
Segundo a manchete do Expresso do passado Sábado "60% do emprego é criado pelo Estado", designadamente através do programa Estágio Emprego que paga entre 419,22 e 691,70 euros, acrescidos de subsídio de refeição, consoante as qualificações, sendo que as entidades empregadoras recebem uma comparticipação pública que é genericamente de 100%, desde que verificados alguns requisitos, ou de 80%.
Verifica-se uma espécie de regresso ao sistema Speenhamland, vigente no Reino Unido na passagem do século XIX, segundo o qual o vencimento dos trabalhadores era complementado através de dinheiros públicos de forma a atingir o valor mínimo de subsistência, de acordo com o preço do pão. Este sistema bem intencionado acabou por não ter os efeitos desejados: pauperização da população trabalhadora por conta doutrem uma vez que as empresas eram incentivadas a praticar salários abaixo do normal, aumentado os seus lucros.
Programas como o Estágio Emprego não são por si só criticáveis. Aliás perante uma taxa de desemprego tão elevada eram imprescindíveis e urgentes políticas públicas de criação de emprego, tanto mais que há uma correlação entre o tempo de desemprego e a dificuldade em ser contratado.
No entanto, esta afectação de recursos públicos em beneficio das empresas é revelador no contexto actual (reforma do IRC, a redução de feriados, as alterações à legislação laboral) de uma tendência: alteração das relações de poder na sociedade em detrimento do trabalho.
Esta parcialidade de tratamento num Governo, que sempre defendeu a saída do Estado da Economia, é notório no seu próprio discurso. Qualquer subsídio dirigido a individuais é visto como uma perigosa esmola que aumentará a sua dependência enquanto que se dirigido a empresas é fomentador de crescimento económico.
Passados dois séculos desde o Sistema Speenhamland há quem continue a caber na descrição da burguesia daquela altura: "rigid, self-righteous, unintellectual, obsessed with puritan morality to the point where hypocrisy was its automatic companion".