Legalidade e ética
É perfeitamente legal que deputados exerçam o seu excepcional direito de requerer a fiscalização abstracta da constitucionalidade de uma norma que os afecta directamente, e apenas a eles, num seu direito estatutário? É.
Foi para isso que a CRP lhes consagrou esse direito? Não.
Um comum cidadão afectado por uma norma inconstitucional naquilo que entende serem os seus legitimos direitos pode fazê-lo? Não, não pode.
Os deputados têm direito a baterem-se pela sua subvenção vitalícia? Claro que sim, mas deviam fazê-lo lançando mão de meios normais para atender a uma questão da sua vida pessoal: no caso, os Tribunais. A Justiça seria assim mais lenta? Seria, mas seria para os deputados a mesma que para os cidadãos que estes representam. E era assim que deveria ser. A ética republicana, na minha naturalmente pessoal e subjectiva interpretação da mesma, a isso obrigaria.
Diga-se, já agora, sem pejo de citar um nome muitas vezes amaldiçoado, que bem andou José Sócrates em acabar com esta benesse para os deputados que a não tivessem adquirido em, julgo, 2008. Daí em diante o tempo servido como deputado conta para a reforma do deputado como contaria o tempo de descontos feitos em qualquer outra actividade profissional. Esse foi um passo de gigante e de enorme coragem política. A seu tempo este privilégio inexplicável extinguir-se-á por si. E ainda bem. Cada vez que a ele voltamos é para nos lembrar que tempo houve em que uns se sentiam com direito a mais do que os seus eleitores. Já basta.