Jornalismo 101: não julgar o livro pela capa
"Por falar em socialismo
lá porque alguém o apregoa
não quer dizer que não esteja
a dizer coisas à toa.E lá porque alguém nos fala
também em revolução
não quer dizer que não esteja
a vender lobo por cão."Sérgio Godinho
José Rodrigues dos Santos, na sua vertente artista kitsch, proferiu uma frase polémica para promover o seu novo livro: o fascismo tem origem marxista - acrescentado, como qualquer fanático da conspiração, pouquíssima gente sabe isto. No meio da atenção mediática pretendida o escritor defende-se com um texto no jornal Público, no qual mistura história das ideias com intervenientes e cuja bibliografia são os próprios livros que o JRS escreveu - a chamada técnica Paulo de Morais.
Sobre a polémica em si não vale a pena perder muito mais tempo, António Araújo e Paulo Pena já escreveram o essencial. Neste episódio o que acaba por ser mais interessante e, ao mesmo tempo, assustador, é perceber que um dos jornalistas mais respeitados do país utiliza como argumento definitivo para a sua tese a existência do termo "socialismo" no nome do partido nazi*.
Ora, se JRS gostasse da literatura para além da que foi escrita por ele, conheceria a famosa passagem de Romeu e Julieta de Shakespeare na qual a principal personagem feminina questiona: o que é um nome? uma rosa com outro nome teria o mesmo aroma. Por outras palavras um nome não afecta a essência das coisas e como tal um jornalista deve ir para além do que é supérfluo, não se restringir ao brilho do papel de embrulho que envolve a propaganda. Nestes tempos dominados por eufemismos são cada vez mais importantes jornalistas de olhos bem abertos. ;)
*"Conversely, nationalist movements became aware of the desirability of spelling out, if not a specific social programme, then at least a concern with economic and social questions. Characteristically it was in industrialized Bohemia, torn between Czechs and Germans both drawn to labour movements, that movements specifically describing themselves as 'national socialist' emerged. The Czech national socialists eventually became the characteristic party of independent Czechoslovakia, and provided its last President (Benes). The German national socialists inspired a young Austrian who took their name and their combination of anti-Semitic ultra-nationalism with a vague populist social demagogy into post-war Germany: Adolf Hitler."
Eric Hobsbawm