Governação e responsabilidade
A ligeireza com que Passos hoje reagiu, quando questionado sobre o destino de Crato, é, para além de uma irresponsabilidade, uma grosseria e um insulto aos portugueses, sobretudo os afectados pelos problemas na colocação de professores, a começar por estes e pelos alunos.
Não é de agora, esta reacção de Passos a problemas criados directamente pelo seu Governo. Desvalorizar o caos, minimizar os erros e as suas consequências, transformam a política num jogo pueril, o contrário do que seria suposto ser. Os governantes (e os deputados) são eleitos para servir o povo, para darem o seu melhor e, caso o seu melhor não seja o suficiente, assumirem as responsabilidades e agirem de acordo com essa assumpção. Com este Governo, com este primeiro-ministro, todos os valores que deveriam reger a conducta dos governantes têm sido subvertidos. Começou com as previsões falhadas de Vítor Gaspar (o único que teve a ombridade de assumir os seus erros e tirar daí as devidas consequências, quem sabe se contra a vontade de Passos), passou pela lenta agonia de Miguel Relvas, pelas sucessivas mentiras de Maria Luís Albuquerque no parlamento, pela confrangedora gaffe angolana de Rui Machete.
Desde Setembro, atingiu-se um cúmulo qualquer de incompetência na Justiça e na Educação. O caos nos tribunais e nas escolas, desvalorizado e não assumido, é a prova de que o princípio de Peter, quando aplicado ao serviço público, pode ser um crime de lesa pátria. Ninguém sabe (a começar pela ministra) onde poderão chegar os danos causados pelo desaparecimento de três milhões e meio de processos nos tribunais portugueses. E os prejuízos trazidos aos professores e aos alunos neste início de ano escolar são incalculáveis.
Já poucos terão dúvidas de que Paula Teixeira da Cruz (que ignorou vários avisos sobre o Citius quando preparava a reforma do mapa judicial) e Nuno Crato (que autorizou um modelo de colocação de professores que continha um erro matemático crasso) são os culpados máximos do inacreditável caos que reina na Justiça e na Educação. Poucos terão dúvidas, também, de que há muito os dois se deveriam ter demitido. Por muito menos Manuel Pinho demitiu-se. Por muito menos (uma piada de mau gosto) em tempos um ministro cavaquista demitiu-se. Por muito menos António Vitorino demitiu-se. E Jorge Coelho também o fez, depois de ter assumido a responsabilidade pela queda da ponte de Entre-os-Rios.
Mas eles, os ministros que governam acima das suas possibilidades, continuam a liderar as equipas que estão a tentar resolver os problemas provocados pelas suas decisões políticas. E continuam porque Passos Coelho, o homem do "não me demito", decidiu que assim deve ser. Poderíamos pensar que o faz por cálculo político - duas demissões tão próximas das legislativas danificariam a imagem do Governo. Mas neste caso, a razão é outra: Passos Coelho não deixa cair Crato e Paula Teixeira da Cruz porque tem um entedimento da política que se mede por tacitismos, uma estatura ética diminuída (senão inexistente) e sobretudo uma dimensão de mediocridade nunca antes vista num primeiro-ministro de Portugal. Passos Coelho nunca entenderá que a política não foi feita para satisfazer egos próprios. Não sabe, nem nunca irá perceber, que a teimosia, num político, é apenas uma virtude quando aliada a uma competência e uma grandeza de espírito. Passos não é competente nem é grande. É apenas um acaso, uma desgraça, uma vírgula mal parida na História do país.