Depois da ocultação e das sombras, teremos a dura realidade
Estamos a dois dias das eleições e a coligação de direita aparece à frente em todas as sondagens. Por muita vontade que tenhamos de enfiar a cabeça na areia, este é um facto indesmentível. Claro que as sondagens podem estar erradas, e no domingo à noite o PSD e o CDS podem ser varridos da governação - mas as probabilidades de isto acontecer são cada vez mais baixas. É possível que o pós-eleições seja um período de negociação confusa, com Cavaco a tentar influenciar PS no sentido do Bloco Central - o que seria talvez uma solução ainda pior do que uma maioria absoluta de direita.
Imaginemos os meses a seguir às eleições, no caso da direita governar com maioria absoluta. Ainda em 2015, e de acordo com os dados mais recentes da execução orçamental, teremos um buraco nas contas públicas e a meta do défice em risco. É bem provável que sejam necessárias mais medidas de austeridade para tapar o buraco. Talvez venha aí o tal novo aumento de impostos sugerido esta semana pela Comissão Europeia. Ou então novo corte do subsídio de Natal, tal como aconteceu em 2011 (e depois de Passos ter garantido a uma criança que tal não iria acontecer). Para além deste buraco (da exclusiva responsabilidade do Governo) há a necessidade de recapitalização do Novo Banco, admitida por quase toda a gente. Esse dinheiro virá, claro, do Fundo de Resolução. Mas o Fundo terá de ser alimentado pelo Orçamento de Estado. De onde virá o dinheiro? Dos contribuintes, claro, os tais que, de acordo com a garantia de Passos, Maria Luís Albuquerque e Cavaco, não seriam chamados a pagar o BES. Talvez o resto do subsídio de Natal chegue para a recapitalização.
A seguir vem o Orçamento de 2016. Nesse já sabemos que irá aparecer o corte de 600 milhões nas pensões. A maioria dos pensionistas verá, uma vez mais, o seu rendimento decepado. Esta medida, por muito que PSD e CDS digam o contrário, está prometida à UE. Vai acontecer, se eles ganharem eleições. Depois, se em 2015 não for atingida a meta do défice, o ponto de partida será mais alto, e portanto será necessário um reforço da austeridade para garantir a meta de 2016. E podemos esquecer a devolução da sobretaxa do IRS - neste momento a receita de impostos está acima do objectivo, mas a devolução do IVA ainda não foi feita, o que irá acontecer apenas depois das eleições.
Mas há mais: o programa de que a coligação PSD/CDS se recusa a falar. E esse programa é o mais ideologicamente à direita desde o 25 de Abril. O PSD e o CDS, se ganharem as eleições, vão mesmo cortar a eito no Estado Social. O dinheiro que neste momento está a permitir que a Escola Pública se mantenha irá ser escoado para o ensino privado, criando uma Educação privada de elite para ricos, financiada pelo dinheiro dos nossos impostos, e outra Educação pública sem condições para pobres. Na Saúde, acontecerá o mesmo. A "liberdade de escolha" (novilíngua) de que fala o programa do PSD/CDS significa que apenas quem tem um seguro de saúde privado terá saúde de qualidade, dado que o desinvestimento no Serviço Nacional de Saúde irá acentuar-se. Cada vez haverá menos profissionais de Saúde a trabalhar no SNS e aumentará o número de pessoas sem acesso a médico de familia, a exames pagos pelo SNS e a operações realizadas em hospitais públicos. Finalmente, na Segurança Social, o plafonamento. Quando uma parte dos contribuintes optar por descontar para sistemas privados, é quase certa a descapitalização do sistema público. E quando isso acontecer, iremos ver o Governo a cortar pensões e subsídios a pagamento, a bem da sustentabilidade da Segurança Social. O plafonamento levará sempre a corte nas pensões a pagamento ou a um aumento de impostos, isso é certo. Tudo para que o sistema financeiro privado possa lucrar um pouco mais.
As escolhas que temos a fazer nas eleições de Domingo são claras. O problema é que a coligação de direita tem feito mais uma campanha de ocultação e mentira. O seu programa de destruição do Estado Social tem sido astuciosamente escondido dos eleitores - se estes soubessem realmente o que significa "liberdade de escolha" pensariam duas vezes antes de votar no PSD e no CDS. Mas a aposta da coligação que não põe as caras dos seus líderes e os símbolos dos partidos que a compõem nos cartazes é clara: contam com a falta de memória e a ingenuidade do eleitor no momento em que decide o seu voto. É um jogo de sombras e de espelhos que, tudo indica, poderá compensar. A curto prazo, se a estratégia resultar, o país (e sobretudo as pessoas) vai sofrer amargamente com isto.