Das coisas insólitas porque esperadas
Parece que alguns comentadores e actores políticos se espantam por acontecer o anunciado. Imaginem algo tão surpreendente quanto a actuação do Secretário-Geral do PS corresponder à sua intervenção no último congresso do Partido Socialista. Como bem diz o Ferreira Fernandes: "quando as coisas se passam de forma tão insólita (porque esperada), é natural que descambem em situações cada vez mais naturais. Ou, se quiserem, surpreendentes."
Ora avaliem o que disse António Costa e pasmem-se com o que está a acontecer. Vejam como é totalmente surpreendente a presente iniciativa política:
Não quero alimentar tabus, nem quero deixar qualquer tipo de equívoco. Em primeiro lugar, nós recusamos o conceito de “arco da governação” como delimitando quem são os partidos representados na AR que têm acesso e têm a legitimidade a partilhar a responsabilidade governativa. Em democracia, quem decide quem representa o povo é o povo, ninguém se pode substituir ao povo a excluir parte dos seus representantes das plenas responsabilidades.
Portanto, que fique claro: nós não excluiremos os partidos à nossa esquerda da responsabilidade que também têm de não serem só partidos de protesto mas de serem também partidos de solução para os problemas nacionais. A vida e a minha própria experiência em Lisboa ensinou-me a não ter excessivas ilusões, já percebi que é mesmo mais comodo estar do lado do protesto do que estar do lado da solução, mas meus amigos, não contarão com o PS para vos ajudar a manterem-se na posição cómoda de ficarem só no protesto e não virem também trabalhar para a solução.
[...] E há um segundo equivoco que não podemos também alimentar: o que é que os portugueses nos pedem e o que nós nos propomos fazer. O que os portugueses nos pedem é algo muito claro: que sejamos alternativa ao actual governo e às actuais politicas. O que é que nós propomos aos portugueses? Ser uma alternativa ao actual governo e às actuais políticas. E portanto, não é possível ser alternativa às actuais politicas com quem quer precisamente seguir as actuais políticas. É fundamental para a democracia que em democracia existam alternativas no campo democrático, o pior que pode acontecer a uma democracia é quando se gera um enorme empastelamento, quando existe um pântano no qual ninguém se diferencia, tudo é farinha do mesmo saco e em que não conseguimos distinguir o que uns propõem do que os outros propõem fazer. Quando há esta confusão o que nós alimentamos não é a democracia, o que nós alimentamos são os extremismos, os radicalismos que são esses sim uma ameaça à democracia.