Cenários
"O que é um homem rebelde? Um homem que diz não"
Albert Camus
O relatório "cenário macroeconómico" é a prova, como se tal ainda fosse necessário, que o PS, apesar da retórica utilizada, não é rebelde. É incapaz de dizer não à austeridade. Com efeito, o documento defende a manutenção da sobretaxa no IRS por mais dois anos, a reposição dos salários na função pública após o limite do concedido pelo Tribunal Constitucional, a queda do consumo público real, o congelamento do número de funcionários públicos, o estudo de novas privatizações, e infere-se a estagnação do Salário Mínimo Nacional.
No entanto, este documento apresenta duas virtudes.
Em primeiro lugar, demonstra que existe e sempre existiu - ao contrário do que a propaganda governamental defendeu - no caminho estreito da austeridade alternativa à política do actual Governo, que possibilite, por um lado, reduzir a desigualdade crescente (reforço do abono de família, do complemento solidário para idosos e do RSI, contrapondo à mais dispendiosa e menos digna aposta nas cantinas sociais), e, por outro, evitar a destruição em curso do mercado interno.
Em segundo lugar, permite questionar se no espartilho ideológico criado pela arquitectura institucional da UE é exequível a aplicação de políticas keynesianas, isto é, seria possível o PS apresentar outro tipo de propostas de forma a serem compatíveis com o seu património de partido pró-europeu? A forma como os parceiros europeus têm vindo a responder às reivindicações gregas parece indiciar uma resposta negativa. Nem é provável que nos próximo tempos ocorra, mesmo com a economia europeia estagnada e em deflação, qualquer alteração, uma vez que do lado da Alemanha, para salvaguarda dos seus interesses a curto-prazo, insiste, imune à realidade, na austeridade - parece decidida a desafiar o aforismo do Lincoln "a house divided against itself cannot stand". Ora, a tomada de consciência destas limitações é fundamental para que os eleitores possam realizar uma escolha informada.