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365 forte

Sem antídoto conhecido.

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01
Out15

Aos quatro milhões de sonâmbulos políticos

Pedro Figueiredo

Captura de ecrã 2015-10-1, às 22.41.43.png

Não sei se já limparam a parede, mas até há pouco tempo esta era a frase pintada na casa onde Agostinho da Silva viveu, ao Príncipe Real.

Nas últimas eleições legislativas, dos 9 626 305 eleitores recenseados, mais de quatro milhões foram abstencionistas (41,97%). Praticamente metade dos que tinham direito a fazê-lo optaram, pelas mais variadas razões, por não votar. As sondagens ou tracking polls que têm vindo a público nos últimos tempos, diárias desde o início da campanha eleitoral, têm revelado resultados absolutamente inacreditáveis tendo em conta o que foram os últimos quatro anos de legislatura desta coligação. Tomando-os como verdadeiros (que faço com sérias reservas, quanto mais não seja pelo princípio de poder colocar tudo em causa), e apesar de não os compreender, aceitá-los-ei com todo o espírito democrático, embora consciente que o sofrimento possa continuar (se não piorar). O que não compreendo e não consigo aceitar é que a abstenção continue tão elevada como em 2011.

Os abstencionistas, regra geral, recorrem quase sempre às mesma justificações: "não faço a mínima diferença", dizem os derrotistas; "os políticos são todos iguais", concluem os desinformados; "fazem quase sempre o contrário do que prometem", acrescentam os conformados. Mas o pior argumento de todos, o que realmente me choca, é quando se ouve o desinteressado dizer que "não ligo para a política". Aquele a quem Bertold Brecht apelidou de analfabeto político. Como se política fosse reduzida a quadraturas de círculos, swaps, resgates financeiros, plafonamentos e escalonamentos de impostos e mais uma trapalhada de informação que, acredito, baralhe o mais comum dos cidadãos. Política é, também, o escrutínio a quem tem o dever de representar o país e tomar decisões em nome de todos. Abster-se de tomar partido nessa escolha é deixar à mercê dos outros, dos que votam, a sorte do seu próprio destino. Pior: é passar um cheque em branco ao vizinho, que por infelicidade até é xenófobo e homofóbico e que vai votar no partido no qual jamais nos passaria na cabeça fazê-lo.

Restam sempre duas outras alternativas. Sim, há sempre alternativa. Jamais se deve acreditar em inevitabilidades. O Homem só conhece uma e dessa ninguém está livre. Há o voto nulo, que pessoalmente considero uma infantilidade (salvo os casos das cruzes mal feitas), daqueles que gostam de fazer obras de arte ou escrever mensagens nos boletins. Por mais originais que sejam, divertem apenas quem conta os votos e, eventualmente, os seus círculos de amigos mais chegados. Dão sempre boas anedotas. Há também o voto em branco. E quem leu o Ensaio sobre a Lucidez de Saramago sabe que a mensagem é bem mais do que subliminar.

Se não se enquadra em nenhum destes casos e, mesmo assim, insiste em abster-se de um direito cuja universalidade foi muito difícil de conquistar, saiba que não passa de um sonâmbulo político. É, em tudo, idêntico ao sonâmbulo tradicional: sai da cama, anda, come, realiza as mais comuns tarefas diárias e até necessidades fisiológicas faz enquanto permanece inconsciente. Tal como no sonambulismo, e ao contrário da crença popular, não é perigoso acordar. Podem ficar, igualmente, confusos ou violentos, com o despertar, mas apenas por tomarem consciência do que (não) fizeram até então.

Para todos, uma mensagem de Agostinho da Silva: "Eu não voto por rótulos. Eu não quero saber das campanhas eleitorais para nada. Eu quero saber das ideias que as pessoas têm e da maneira como depois as vão defender e praticar".

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«As circunstâncias são o dilema sempre novo, ante o qual temos de nos decidir. Mas quem decide é o nosso carácter.»
- Ortega y Gasset

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