Boston
Pouco passava das oito da noite quando os alertas começaram a chegar. Tal como no Newsroom de Will McAvoy, há computadores a apitar com luzes vermelhas. É importante, portanto.
As primeiras informações são escassas. Duas explosões na maratona de Boston, não se sabe se há vítimas. Últimas horas, mapas, imagens a correr enquanto o pivot diz e repete o pouco que sabe, números para trás e para a frente como é natural quando o assunto é fresco.
Há desde logo um trabalho de bastidores a fazer: na maratona corriam 16 portugueses e é preciso saber como estão.
Ao telespectador, ouvinte ou leitor mais atento, pode chocar a vontade de obter esta informação rapidamente. Numa altura em que se confirmam as vítimas mortais e as dezenas de feridos, quando já se instalam rumores de atentado e se elevam os níveis de vigilância, compreendo que possa parecer um pouco de “umbiguismo” esta urgência em localizar cidadãos que partilham a nossa nacionalidade.
Não é. Primeiro, porque a obtenção desta informação em nada compromete o restante apuramento dos factos. Ninguém deixará de falar nas vítimas, nas implicações ou nos culpados só por procurar os portugueses. Segundo, porque saber que os portugueses estão bem não é uma satisfação em detrimento do estado de saúde de cidadãos de outros países, mas apenas uma constatação. E terceiro, porque esse telespectador, ouvinte ou leitor mais atento pode não ter familiares ou amigos a correr em Boston, mas outros certamente terão.
A proximidade (neste caso de nacionalidade) é um dos critérios que justifica a atenção dada a um acontecimento a tantos quilómetros de distância. Isso e, claro, podermos estar a falar de um atentado num país com antecedentes e com possíveis repercussões na política internacional.
A mesma notícia teria, no entanto, um impacto diferente noutro país. É aí que entra a influência que as agências de notícias e as grandes cadeias norte-americanas têm na informação em Portugal, e que pode e deve ser discutível.
Claro que nos tocou a todos a história de Martin Richard, o menino de oito anos que morreu em Boston após ter abraçado o pai. Os media norte-americanos foram, aliás e como é habitual, rapidíssimos a contar o enredo e continuam incansáveis na procura de familiares e amigos que testemunhem como o menino era perfeito.
Infelizmente, ele não é mais do que outra vítima do terrorismo, um crime que não deve ter nem nacionalidade, nem proximidade, nem qualquer outro critério que nos leve a encher as redes sociais de mensagens um tudo ou nada parolinhas como “todos somos Boston” ou “pray for Boston”.
Há uma semana, 11 crianças afegãs morreram num bombardeamento da NATO. Apesar do inesperado que é a explosão de duas bombas numa maratona, apesar da existência de imagens ajudar à sensibilização da opinião pública, apesar do historial dos EUA, ainda assim, o Martin não é mais do que elas.