Aftershock - Robert Reich
(...) A 5 de Janeiro de 1914, Henry Ford anunciou que pagava aos trabalhadores da sua linha de montagem em Highland Park, no Michigan, do Modelo T, famosa pela sua produtividade, cinco dólares por dia de oito horas. Era quase três vezes o que o típico empregado fabril ganhava na altura. À luz desta jogada audaciosa, alguns elogiaram Ford como amigo do trabalhador americano; outros chamaram-lhe louco ou socialista, ou ambas as coisas. O The Wall Street Journal classificou o gesto dele como «um crime económico». Ford achava que era uma acção empresarial astuciosa e a história demonstrou que ele tinha razão. O salário mais elevado fez dos empregados na indústria automóvel de Ford clientes que passaram a poder despender 575 dólares por um Modelo T. De facto, as suas aquisições fizeram regressar alguns desses pagamentos de cinco dólares à Forde ajudaram a financiar uma produtividade ainda maior no futuro. Ford não era louco nem socialista, mas um arguto capitalista cujos lucros mais do que duplicaram de 25 milhões de dólares em 1914 para 57 milhões dois anos depois.
(...) Os economistas clássicos viram os mercados como autorregulados. Tinham suposto que o pleno emprego acabaria sempre por prevalecer. Qualquer excesso de desemprego faria os salários cair até que os empregadores voltassem a considerar lucrativo contratar trabalhadores. De acordo com esta perspectiva, o desemprego persistente resultava da resistência teimosa da parte dos trabalhadores que insistiam em conservar os seus anteriores níveis salariais, mesmo que não trabalhassem o suficiente para os justificaram. A única solução consistiria em fazê-los sentir a falta de trabalho o tempo suficiente para que aceitassem salários mais baixos. Esta visão das coisas enquadrava-se perfeitamente no darwinismo social predominante da altura: só os mais aptos deveriam sobreviver e qualquer tentativa de proporcionar mais conforto aos menos aptos estava condenada a ser danosa para a maior parte da sociedade. Depois da Grande Derrocada de 1929, o secretário do Tesouro de Herbert Hoover, o industrial milionário Andrew Mellon, fazendo eco desta visão predominante, admoestou contra a acção do governo. Aconselhou ele que se deveria deixar cair os salários e os preços, depurando assim o sistema de desperdício e lassidão. «Liquide-se o trabalho, liquidem-se os stocks, liquide-se o agricultor, liquide-se a propriedade imobiliária. Isso eliminará a podridão do sistema. [...] As pessoas trabalharão mais e levarão uma vida mais virtuosa.» Tratava-se dos mesmo disparates contra os quais Marriner Eccles se insurgira, o que o levou a concluir que as pessoas no poder estavam a tentar justificar o status quo pela invocação de uma moralidade duvidosa.